Estávamos
quase de mãos dadas, estudando com o olhar os carros que formavam uma nuvem de
fumaça, analisando o labirinto de rodas de borracha negra como a noite que caía
sobre nossos ombros soltos na pista. Foi quando o vi. Seus olhos descompassados
clareavam seu rosto pálido que ocupava um lugar quase inexistente dentro de seu
veículo cobre. Por um momento as mãos não se encontravam. A mão que me afaga
diariamente foi na frente, abrindo caminho por entre os automóveis que
insistiam em ocupar a pista que atravessaríamos naquela hora. E eu fiquei ali,
imóvel, no canteiro central. Aqueles olhos hipnóticos entoavam canções que
venciam buzinas e luzes e céus que escureciam sobre nossas cabeças cansadas.
Misto de desespero, desejo e vontade. Quis estar ali dentro, ali ao lado. Quis
ser mais mulher ao lado daquele homem de olhos de mar. O sinal já não mais
orquestrava a fila de motoristas impacientes e bocas nervosas gritavam na
esperança de fazer o trânsito seguir seu caminho. O trânsito seguiu. Ele seguiu. E eu fiquei
ali, imóvel. Ouvi gritos das mãos que me cuidam gesticulando sinais nervosos.
Voltei a uma realidade que não pensei viver. Esperei o maestro rubro parar
novamente os automóveis. Atravessei a rua. E a vida que poderia ter sido,
seguiu sem mim, para uma pausa breve em outro semáforo qualquer.
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