sábado, 25 de junho de 2011

A lágrima

Cada um com seu pranto e em cada canto uma canção qualquer.
Os dedos trêmulos trovejaram de desejo e de dor
...e o que foi um dia  de sol gelou o vento manso vindo do nordeste... 
e borbulhou de contentamento...
...e virou saudade...
depois de tudo respirei, fechei os olhos
e
.chorei.
.         .


Girl and Tear - GUAYASAMIN Ecuador abstract Painting


Carolina Morais

quinta-feira, 9 de junho de 2011

Assassinos de Momentos

Miró, Joan. Milano

As coisas só morrem para nós quando nós as matamos de fato. Caso contrário, continuam lá e cá. Dentro e fora de nós mesmos. Somos todos, no fundo, assassinos de lembranças e sentimentos. Se não as matamos, vivemos carregando sacolas repletas de arrependimentos e lágrimas de tristeza nas costas. Somos todos, então, assassinos de lembranças e momentos.

Carolina Morais

O livro de Mia

Mia acordou cedo, fez café forte e esquentou o pão no forninho elétrico. Cortou pedaços de maçã como quem corta tomate; com calma e destreza. Misturou banana amassada e uns poucos pedaços de melão com suco de laraja e mel em uma taça de vinho grande e comeu com a graciosidade de uma garota propaganda de condicionador ao sorrir contra o vento.
Capa do livro Tessituras em contos, crônicas, poesias e imagens.  
Ana Valeska Maia, Marcia Sucupira e Maíra Ortins. 
Expressão gráfica editora, 2010.
O pão estava no ponto. A faca deslizava no pote de requeijão light e corria sobre o carioquinha disforme. O cheiro era arrebatador, assim como o cheirinho do café vindo do móvel que ficava ao lado da geladeira; a cafeiteira anunciava as últimas gotas a cair no copo acrílico transparente. Pacientemente, Mia olhava cada gotinha que se despedia do copo superior da maquininha de fazer café. A mocinha então,esperou que todas elas se transferissem para o copo inferior, que já colecionava gotinhas por 5 minutos. Colocou o café em uma xícara azul-bebê, estampada com rosinhas amarelas. O pires, verde-limão, dava um ar descontraído ao café de todos os dias na casa de bonecas de Mia. Ela pegou o pão e o café e foi para a varanda. Buscou o livro e se sentou na cadeira de palha cor-de-rosa.Colocou o café na mesinha ao lado da cadeira e o pão ficou ali, geometricamente enquadrado em sua pequenina mão esquerda, envolto por um guardanapo lilás e branco. Mia repousou os pés no parapeito da varanda e sentiu a brisa fria das 6 da manhã percorrer seus dedos dos pés. Comeu um pedaço do pão, dois, três. O café estava quente demais e o vento gelado o esfriava sem pressa, soprando as beiradas da xícara cheia de líquido negro. Ela sentiu uma calma de parar o tempo. Pegou o livro novo com a mão direita. Olhou a imagem da capa: uma garota de sobrancelhas grossas e olhar fixo, com o corpo imerso em um mar absolutamente azul. Ficou ali a admirar a capa por minutos longos. O pão tornara-se migalhas no colo de Mia e um pássaro curioso pousou em sua coxa esquerda, comendo os restinhos do alimento da manhã. Mia achou aquilo lindo. Limpou a mão no guardanapo e tomou um gole do café; ainda quente demais para descer pela garganta seca. Abriu o livro e se deliciou com poesia pura. Quando a poesia teve fim, começaram os contos, as crônicas e as imagens. Mia adormeceu na varanda e sonhou com a certeza de que naquele momento, tinha um livro para "chamar de seu". O dia raiou enquanto o café frio refletia o sol quente e o ar úmido do dia seguinte.



Carolina Morais